PROCURA-SE SONHADORES

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PROCURA-SE SONHADORES

Tenho ficado muito preocupada com a situação que se encontra a humanidade, o aumento da intolerância, terrorismo, violência e a ausência de valores me deixa atordoada e decepcionada. Em meu micro-mundo onde atuo como educadora, professora, mãe e amiga as últimas conversas tem me deixado apreensiva e incomodada.

Verifico situações que revelam a hipocrisia e a falta de coerência nas ações dos adultos. Falamos muitas vezes dessa geração de jovens “que nada querem fazer além de ficar na internet” quando os próprios pais fazem praticamente a mesma coisa, pois oferecem tablets e celulares para ocupar crianças e adolescentes para distraí-los e não terem que se ocupar com as brincadeiras, conversas e convivência em família.

É obvio que o impacto será devastador pois elas se acostumam a buscar as respostas para suas angústias virtualmente e isso pode torná-los vulneráveis a desconhecidos mal intencionados, com informações falsas, levando ao isolamento e até ao suicídio, como vimos recentemente em jogos que incentivam a auto mutilação e suicídio.

Substituímos nosso papel de orientadores e zeladores dos jovens e crianças e passamos a contabilizar o dinheiro que investimos na “educação” como garantia de que no futuro elas possam ser bem sucedidas e materialmente prósperas mesmo com a nossa ausência. Não há nada de errado em almejar esta estabilidade futura, mas sacrificar o presente pode não ser a melhor escolha. Será esse o principal objetivo de existência? Ganhar muito dinheiro e comprar tudo o que quiser? Onde fica a reflexão sobre os sonhos, talentos, aspirações e valores humanos?

Há outras incoerências e problemas nas famílias, os mesmos pais que dizem que devemos ajudar em casa, cooperar com as atividades e tratar os outros com respeito, colocam seus filhos em escolas particulares onde o tempo todo alunos são incentivados a competir, sendo sempre comparados e pontuados de acordo com suas habilidades de memória e execução de tarefas, onde não há cooperação ou incentivo no sentido de criarmos seres mais humanos e compassivos.

Os adultos de hoje são a causa de muitos dos problemas que o mundo enfrenta, somos frutos de uma sociedade consumista e inconsequente, egoísta e preconceituosa e se hoje não conseguimos encontrar pessoas que possam se tornar políticos honestos e limpos para colocarmos no governo e nos sentirmos representados, não pode ser motivo de espanto pois as mesmas atitudes que detestamos como a mentira, falta de generosidade, diálogo e acolhimento são encontradas em casa.

Outro dia em conversa com uma adolescente de treze anos ela desabafou dizendo que sempre que a questão dos homossexuais é colocada em pauta ela se decepciona com os adultos que a cercam pois apesar de seus familiares serem pessoas boas ainda acham que “não é certo que os homossexuais andem de mãos dadas ou sejam afetuosos em público e que isso deveria ser proibido nos shoppings e locais públicos”. Quando ela questionou porque os outros não podem ser livres e autênticos em qualquer lugar, a resposta foi uma chuva de comentários homofóbicos que não só contaminam mas revelam o quanto ainda temos que evoluir.

Outro exemplo que vivenciei com uma adolescente de 17 anos que enfatizava a falta de sensibilidade de uma pessoa da família que toda vez que a levava no shopping tentava comprar TUDO o que ela não precisava, numa tentativa de encher o buraco que a ausência em casa provocava. A fala foi a seguinte: “eu preferia que meus pais trabalhassem menos, fossem menos consumistas e passassem mais tempo em casa comigo e meu irmão, nós já temos muitas coisas, muito mais do que precisamos, o que falta mesmo é tempo para as conversas e coisas simples como assistir um filme, comer pipoca e fazer nada juntos…”

Em outro caso recente um aluno que reuniu um grupo de amigos para fazer um trabalho de escola em casa e no grupo de seis pessoas haviam dois negros, um menino e uma menina, inicialmente a família foi cordial mas quando os amigos foram embora os pais fizeram um verdadeiro questionário sobre qual era o comportamento, atividade e o porque ele tinha levado aqueles amigos e não outros para o trabalho em casa. O adolescente ficou indignado e questionou ou pais o porquê daquela preocupação pois como eles são uma família cristã, que regularmente frequenta igreja e cultos, onde ouvimos que todos são filhos de Deus e criados iguais, porque na prática eles tinham atitudes tão diferentes do discurso?

É mesmo decepcionante quando vemos os adultos que deveriam servir de modelos e orientar os filhos para serem mais abertos, aceitar e valorizar as diferenças, sejam elas quais forem, acabam por deixar cair as máscaras e perdem não só a autoridade moral quanto o respeito e admiração dos filhos.

Eu mesma também tive que romper com muitos valores que minha família nutria pois o ranço do preconceito racial, social e homofobia estiveram presentes em minha casa também. Mas eu tive a sorte de encontrar modelos mais elevados e hoje sou profundamente grata por ter ido sempre contra a corrente, ter buscado soluções diferentes para os problemas comuns na adolescência, desde sempre fui “fora da caixa” e graças a isso sou muito feliz e auto realizada, minha vida tem propósito, meus ideais se transformaram em valores e meus talentos se desenvolveram apesar do ambiente inóspito e materialista que vivi.

Porém não vou só apontar as falhas e criticar o modo como os outros se portam, na verdade estes comportamentos sempre transformam em inspiração e motivação para a continuidade e desenvolvimento de meu trabalho, além de uma preciosa oportunidade para transformar e melhorar as relações com a sociedade e o mundo. Esse incômodo me incentivou a criar um programa de LIDERANÇA PARA O FUTURO destinado a jovens entre 13 e 19 anos que buscará desenvolver condições propícias para que estes adolescentes floresçam e se tornem os adultos que vão transformar o mundo em um lugar mais pacífico, menos consumista, mais cooperativo e justo.

Eles aprenderão a meditar, filosofar, ouvir o outro, discordar com elegância, fortalecer suas convicções e descobrir seus talentos. Abordaremos em nossos encontros temas como ética, compaixão, sustentabilidade, virtudes e sonhos. Os participantes serão convidados e orientados a realizar projetos voluntários que beneficiem a comunidade e despertem a compaixão e a responsabilidade com o mundo que nos cerca.

Se de fato desejamos um futuro melhor, governantes mais comprometidos com o bem estar das pessoas e que promovam ações mais justas, equânimes e éticas devemos começar a preparar e capacitar os jovens agora, afinal esta geração que está no poder vai passar e a nova geração poderá quem sabe consertar os estragos que fizeram.

Citando a musica Imagine, de John Lennon, “Imaginem todas as pessoas vivendo em paz. Eu sei que sou um sonhador, mas não sou o único. Espero que um dia você se junte a nós e o mundo será como um só.

O futuro é composto por “agoras”, amanhã pode ser tarde demais para começar. Se não nos preparamos para os desafios que estão por vir o mundo não será um lugar melhor, a degradação moral, ética e ecológica será um resultado inevitável. Vamos sonhar juntos, sonhos coletivos tem mais chance de se realizar. Vamos SER a mudança que desejamos ver no mundo!

 

Regina Proença é filósofa, mestra em Comunicação e Cultura. Coordena os projetos de Educação para Paz no Coletivo Cultural Fora da Caixa.

Em breve divulgaremos o cronograma e os detalhes do programa LIDERANÇA PARA O FUTURO, que terá início em Agosto.
Se vocês conhecem jovens entre 13 e 19 anos que gostariam de participar do programa de Liderança para o Futuro entrem em contato conosco. Vamos oferecer 20 bolsas e os interessados em participar podem se inscrever através do email contato@foradacaixacoletivo.com.br

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